- Então, por que é tão quieta na aula? - perguntei olhando nos olhos dela.
- Ninguém precisa de mim ou da minha opinião lá - ela me respondeu com uma fala tranquila e segura.
Minha mente pifou, me deu um branco. De repente, esqueci todas as perguntas que gostaria de fazer à Bárbara. Na verdade, sabia o que eu queria saber, mas não sabia como ficar sabendo. Ela me olhava fixo nos olhos como se esperasse mais algum questionamento meu. Minha boca tremeu e ameaçou emitir algum som. Nada saiu. Minha mão estava suada. Me faltava ar naquele momento. Olhei para o chão tentando procurar um nada. Fechei os olhos.
- Você está bem? - me perguntou Bárbara, preocupada.
- S-sim - respondi gaguejando e vacilando na fala.
Lembrei-me daquele primeiro dia. Felipe me dizendo para não olhar Bárbara por tanto tempo. A empolgação dele com a simples possibilidade de quem sabe transar com ela um dia. Me recordo do primeiro ao último gole de cerveja que tomamos depois da aula daquela noite. A cadeira em que eu estava sentado estava riscada no encosto. A mesa tinha um número de telefone pela metade. A colega da frente não largava o celular nem por 1 segundo. A colega da direita olhava para o professor com o mesmo tédio que uma criança de 3 anos olha um jogo de futebol americano com o pai.
Enquanto pensava nisso tudo, levantei a cabeça, abri um sorriso e as palavras começaram a sair da minha boca.
- O Felipe acha que eu estou “apaixonado” por você - falei e logo comecei a rir.
- E você está? - me perguntou sem jeito.
- Não - respondi o mais rápido possível.
Bárbara só me olhou e sorriu, como se estivesse ficado sem palavras.
- Então, por que saiu da universidade anterior? - perguntei à ela.
- Sabe, infelizmente não estamos em um país em que as coisas funcionam como realmente deveriam funcionar. Tive problemas com a inscrição no vestibular, mas consegui. Tive problemas na matrícula, mas consegui. Tive problemas com o financiamento e a ajuda que o governo deveria oferecer, mas consegui. Tive problemas com o transporte, mas consegui. Tive problemas com os colegas, e não consegui mais. Resolvi abandonar aquilo tudo e achei que a U.N.I fosse a melhor opção, pois fica mais perto para mim, foi tudo mais fácil e está bem mais interessante estudar aqui.
- Nossa, que complicação.
- É, mas agora está tudo certo.
- E quem era aquele homem que lhe deu carona um dia desses depois da aula?
- Aquele que o Felipe viu? - questionou Bárbara e riu ao mesmo tempo.
- Sim.
- É meu vizinho. Como eu não tenho como ir para casa, ele sempre me dá essa ajuda.
- Ah bom. E aquela criança da foto que mostrou para sua amiga? Você chamou de “filhinho”.
- É meu irmãozinho. Chamo ele assim porquê sempre sou eu que estou cuidando daquela fofura.
- Desde quando está namorando?
- Conheci meu namorado quando vim morar aqui e estamos quase morando juntos agora.
- Tenho outra pergunta para fazer, mas não sei se vai gostar.
- Se não for me pedir qual motel eu prefiro ir, não tem problema - Bárbara disse e riu alto no meio do saguão da faculdade, e fez com que eu ficasse com tanto vergonha de todos, ao mesmo tempo que ria da risada dela.
- Não é isso - afirmei.
- Então pode perguntar.
- Por que você tem uma conta com nome falso naquele aplicativo para conhecer pessoas que o Felipe costuma chamar de “cata sexo”?
Antes da resposta, Bárbara voltou a rir alto, mas parece que logo lembrou de alguma coisa e parou.
- O Tinder? - ela perguntou ainda sorridente.
- É.
- Não sou eu. É da minha irmã mais nova, a Clarice. Só que eu não sabia que o Felipe chamava aquilo de “cata sexo” - respondeu Bárbara e voltou a rir.
- Ele tem ideias muito estranhas, às vezes.
- Percebi isso.
- Bom, eu preciso ir. O “senhor” tem mais alguma pergunta?
- Acho que deu por hoje. Nos falamos semana que vem.
- É, valeu - disse Bárbara com um tom de voz estranho. Parecia não acreditar nisso, que falaríamos novamente na próxima aula, mas eu sorri para tentar passar confiança à ela de que isso aconteceria. Ela devolveu um sorriso, porém, não muito empolgado e virou as costas.
-------
Eu nem sequer acreditava no que havia acontecido. Eu falei com Bárbara. Ouvi a voz dela por um pouco mais do que dois intensos minutos. A mesma morena que eu olhei tanto por tantas aulas e estava tão curioso para conhecer. Todos os mistérios que ela parecia esconder não existiam. Ela era realmente só mais uma perdida no meio de tantos outros perdidos, como eu, como Felipe, como Natasha, como a irmã Clarice ou como o professor de terça-feira.
Não demorou muito e Felipe tentou me ligar. Assim que cheguei em casa, liguei de volta. Imaginei que fosse gritar o mais alto possível para saber como foi a conversa com a Bárbara, se eu tinha transado com ela e se ela realmente era garota de programa, mas...
- Preciso te dizer o que eu descobri sobre Bárbara - ele disse sério, assim que atendeu ao telefone.
- Ela me explicou tudo, Felipe. Deixa ela de lado. Nós já nos intrometemos demais na vida dela.
- Cala a boca e me escuta – ordenou Felipe e eu senti sua respiração ofegante.
CAPÍTULO ANTERIOR: http://www.vozesdeumgaroto.com.br/2015/09/barbara06.html
PRÓXIMO CAPÍTULO: http://www.vozesdeumgaroto.com.br/2015/10/barbarafinal.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário